As florestas, vistas como obstáculos ao desenvolvimento, foram pouco a pouco derrubadas, ameaçando o clima do planeta.
A ação humana fez com que alguns cientistas designassem a nossa era geológica como Antropoceno, dados os efeitos causados pela nossa espécie, que afetam o meio ambiente e a biodiversidade.
O sinal de alerta já foi ligado e apontou a urgência de revertermos esse ritmo acelerado.
A inteligência e a racionalidade, no entanto, que conseguiram coisas inimagináveis, não parecem capazes de impedir que a humanidade caminhe para a autodestruição.
É como se o Apocalipse, previsto no último livro da Bíblia, fosse o nosso destino.
Entretanto, como afirma Ailton Krenak, quando a humanidade desaparecer, vai ficar tudo bem com o planeta. A vida na Terra, quem sabe, poderá até mesmo respirar aliviada.
"O mundo começou sem o homem e terminará sem ele", já dizia Lévi-Strauss. Somos menos relevantes e extraordinários do que imaginamos.
Basta dizer que 99,9% dos habitantes do planeta são microrganismos, cuja existência foi descoberta pelos humanos apenas no século XVII; ou que os fungos estão há mais de 1 bilhão de anos na superfície da Terra.
Para se ter uma ideia do que isso significa, os primeiros Australopithecus que deram origem à espécie humana apareceram há somente 2,5 milhões de anos, enquanto a idade do Homo sapiens não passa de 300 mil anos.
Os dinossauros, quando foram extintos, reinavam havia 160 milhões de anos como a espécie dominante.
Mas a inteligência humana, nossa grande arma de dominação sobre as demais espécies, ironicamente parece ser, também, uma das maiores responsáveis por abreviar nosso próprio fim.
O que a humanidade deve fazer para permanecer mais tempo por aqui?
Já está na hora de pensarmos mais seriamente sobre isso?
Essa deve ser uma questão relevante?
Ou podemos nos conformar com o fatalismo escatológico?
É possível evitar nosso desaparecimento, ou caminharemos a passos firmes para o abismo?
Essas são algumas das provocações que Ailton Krenak elabora no livro Ideias para adiar o fim do mundo. Sim, é possível ficarmos um pouco mais em nosso planeta, desde que consigamos reprogramar o software mental que governa nossas ações.
É necessário inventarmos uma nova consciência para vivermos um processo de metanoia coletivo.
Nas palavras de Krenak, a humanidade precisa enriquecer sua subjetividade, ampliar seus horizontes, "suspender o céu", para que possa transformar seu modo de estar no mundo.
O pajé Davi Kopenawa descreve os brancos como "povo-mercadoria", formado por "pessoas que se definem pelas coisas".
Essa cultura, que invadiu o Brasil, as Américas e dominou o mundo, despersonaliza a natureza e a transforma em objeto, negando a vida de tudo o que nos rodeia para torná-la "resíduos da atividade industrial e extrativista".
Essa atitude de negação é oposta à filosofia dos povos originários, que assumem o compromisso com todas as formas de vida e com o planeta porque os vêem como parte do todo.
A superioridade da espécie humana é uma ilusão, nós somos apenas mais uma a compor a ampla rede interdependente que garante o ciclo da vida no planeta.
A natureza não deve ser transformada em coisas porque é composta de vidas como a nossa, com as quais estamos conectados. Faz sentido.
A essa altura do campeonato, contudo, desde que a humanidade se assumiu como o agente transformador que paira impunemente sobre as demais espécies, tem sido difícil desconstruir esse ego diabólico.
Seria possível retroceder e mudar nossa forma de estar no mundo?
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A FÊ E O FUZIL - Crime e religião no Brasil do século XXI - Bruno Paes Manso - págs. 283/284.