Os efeitos da gestão por meio de objetivos e projetos foram objeto de numerosas análises sociológicas e psicológicas, algumas das quais com ampla repercussão.
Hoje, o "estresse" e o "assédio" no trabalho são reconhecidos, em relação ao aumento dos casos de suicídio no local de trabalho, como "riscos psicossociais" dolorosos, perigosos e especialmente onerosos para os seguros coletivos".
Se esses sintomas se referem com frequência à intensificação do trabalho, ela mesma ligada aos fluxos tensos e às consequências perversas da redução do tempo de trabalho sob exigências de produtividade, patologias mentais como o estresse têm relação com a individualização da responsabilidade na realização dos objetivos.
Hoje, mais do que antes, o assalariado, sozinho diante de tarefas impossíveis ou duplas injunções, corre o risco de perder a consideração de chefes ou colegas.
O enfraquecimento dos coletivos de trabalho reforça esse isolamento.
A intensificação dos controles põe em questão o "jogo social" dentro da organização, isto é, a margem de liberdade que é dada pela relação salarial e que dá sentido ao trabalho, da mesma forma que contraria a aspiração dos assalariados a uma maior autonomia real.
O risco profissional, hoje normal, põe o indivíduo numa situação de vulnerabilidade constante, que os manuais de gestão interpretam positivamente como um estado de exaltação e enriquecimento ("uma prova que nos faz crescer").
Quando o sujeito empresarial vincula seu narcisismo ao sucesso de si mesmo conjugado com o da empresa, num clima de guerra concorrencial, o menor "revés do destino" pode ter efeitos extremamente violentos.
A gestão neoliberal da empresa, interiorizando a coerção de mercado, introduz a incerteza e a brutalidade da competição e faz os sujeitos assumi-las como um fracasso pessoal, uma vergonha, uma desvalorização.
As contradições da nova organização do trabalho, atestadas pelos oximoros sociológicos citados anteriormente ("comprometimento coagido", "coerção flexível" etc.), apenas reforçam as decepções profissionais e impedem qualquer possibilidade de conflito aberto e coletivo.
Uma vez que a equipe e o indivíduo aceitam entrar na lógica da avaliação e da responsabilidade, não pode mais haver contestação legítima, pelo próprio fato de que é por auto-coerção que o sujeito realiza o que se espera dele.
Em todo caso, o sujeito no trabalho parece mais vulnerável na medida em que a gestão exige dele um comprometimento integral de sua subjetividade.
Um dos paradoxos do novo poder gerencial, que exige esse comprometimento, é, sem dúvida, a deslegitimação do conflito acarretado pelo próprio fato de que as exigências são "sem sujeito", não têm autor ou fonte identificável, são consideradas integralmente objetivas.
O conflito social é impedido porque o poder é ilegível. É isso, sem dúvida, que explica uma parte dos novos sintomas de "sofrimento psíquico".
✅ Corrosão da personalidade
Na linha direta das observações de Marcel Mauss sobre o caráter histórico e cultural da pessoa, muitos sociólogos deram ênfase à "liquidez", à "fluidez" ou à "evanescência das personalidades contemporâneas.
Para Richard Sennett, a organização flexível, apresentada às vezes como uma oportunidade para o indivíduo moldar livremente sua vida, na realidade abala o "caráter" e corrói tudo que existe de estável na personalidade: os laços com os outros, os valores e as referências.
O tempo da vida é cada vez menos linear, cada vez menos programável. Sob esse ponto de vista, o sinal mais tangível da nova normatividade é que "em longo prazo não existe”.
O trabalho não oferece mais um quadro estável, uma carreira previsível, um conjunto de relações pessoais sólido.
Instabilidade dos "projetos" e das "missões", variação contínua das "redes de contatos" e das "equipes" o mundo profissional torna-se uma soma de "transações" pontuais, em vez de relações sociais implicando um mínimo de lealdade e fidelidade.
O que tem necessariamente um impacto sobre a vida privada, a organização familiar, a representação de si mesmo: "O capitalismo do curto prazo ameaça corroer [...] o caráter, em particular os traços de caráter que unem os seres humanos uns aos outros e dão a cada indivíduo um sentimento durável de seu eu.
Em especial, o assalariado não encontra mais apoio na experiência que acumulou durante a sua vida profissional.
Essa tendência a considerar somente as competências imediatamente utilizáveis explica sua rápida obsolescência, como a exclusão dos “seniors" da vida profissional.
Ela tem uma relação complexa com a representação da vida como "capital humano" que se preserva através dos tempos.
Na realidade, esse capital humano está sujeito ao mesmo risco de desvalorização que o capital técnico, o que acaba afetando profundamente os indivíduos que, com a idade, veem-se confrontados com o sentimento deprimente de sua inutilidade social e econômica.
Os princípios práticos são claramente enunciados na pesquisa que Sennett realizou com os assalariados: “A gente tem de começar sempre tudo de novo", "a gente tem sempre de mostrar nosso valor", de "começar sempre do zero".
O efeito é múltiplo: uma usura profissional acelerada e um "caos" relacional e psíquico. A nova personalidade? "Um eu maleável, uma colagem de fragmentos em perpétuo devir, sempre aberto à experiência nova", segundo Sennett.
✅ Desmoralização
Vimos antes que a neogestão tende a controlar comportamentos e atitudes, solicitando um esforço constante de autocoerção.
Essa "ascese" a serviço do desempenho da empresa, combinada com uma avaliação regular dos assalariados dentro da "cadeia gerencial", normatiza as condutas, ao mesmo tempo que demole os engajamentos dos sujeitos uns com os outros.
Relações, sentimentos e afetos positivos são mobilizados em nome da eficácia.
Eva Illouz ressalta como o espaço da empresa e do consumo é saturado de sentimentos instrumentalizados pelas estratégias econômicas.
A importância do tema das "emoções" em cursos e testes (capital emocional, inteligência emocional, competências emocionais) remete a essa obrigação de bem-estar e amor, que necessariamente introduz uma dúvida permanente sobre a sinceridade dos sentimentos demonstrados.
A corrosão dos laços sociais traduz-se pelo questionamento da generosidade, da fidelidade, da lealdade, da solidariedade, de tudo o que faz parte da reciprocidade social e simbólica nos locais de trabalho.
Como a principal qualidade que se espera do indivíduo contemporâneo é a "mobilidade", a tendência ao desapego, e à indiferença que dele resulta, isso acaba contrariando os esforços para exaltar o "espírito de equipe" e fortalecer a "comunidade da empresa".
Mas essa valorização do “teamwork” dentro da nova organização do trabalho não tem nada a ver com a constituição de uma solidariedade coletiva: equipes de geometria variável são estritamente operacionais e funcionam em relação a seus membros como uma alavanca para levar a contento os objetivos determinados.
Mais amplamente, a ideologia do sucesso do indivíduo "que não deve nada a ninguém", a ideologia do self-help, destrói o vínculo social, na medida em que este repousa sobre deveres de reciprocidade para com o outro.
Como manter juntos sujeitos que não devem nada a ninguém? Provavelmente a desconfiança, ou mesmo o rancor, em relação aos maus pobres, aos preguiçosos, aos velhos dependentes e aos imigrantes, tem um efeito de "cola" social. Mas ela também tem seu reverso, se todos se sentem ameaçados de um dia se tornarem ineficazes e inúteis.
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(A nova razão do mundo - Ensaio sobre a sociedade neoliberal - Pierre Dardot e Christian Laval - págs. 362/366)