Minuto da consciência crítica: Comunidade e solidariedade Destaque

O terceiro conjunto de valores mais sólidos … é a noção de comunidade e a ideia que mais se aproxima dela, a de solidariedade.

Comunidade / solidariedade expressa o princípio pelo qual as pessoas devem cooperar umas com as outras não apenas por aquilo que recebem individualmente, mas por comprometimento real com o bem-estar dos outros e por um senso de obrigação moral de que isso é o certo a ser feito.

Quando tal cooperação ocorre no cotidiano, em atividades mundanas nas quais as pessoas se ajudam umas às outras, usamos a palavra “comunidade"; quando a cooperação ocorre no contexto de uma ação coletiva para atingir um objetivo comum, usamos o termo "solidariedade".

Solidariedade tipicamente sugere também uma ideia de poder coletivo - "unidos venceremos, divididos cairemos" mas a unidade que se defende ainda está amparada no mesmo princípio que sustenta a noção de comunidade; que a cooperação não deve ser motivada exclusivamente por preocupações instrumentalistas com nossos interesses egoístas diretos, mas sim por meio de uma combinação entre obrigações morais e preocupação com os outros.

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Dentro das sociedades capitalistas, a ganância e o medo (entendidas como motivações individuais) interagem com o individualismo competitivo e com o consumismo privativo, criando formas culturais difundidas que geram um espaço hostil ao valor de comunidade/ solidariedade.

Tradicionalmente, os oponentes do capitalismo previam que o sistema iria acabar gerando tendências contraditórias que reforçariam os laços de solidariedade.

Essa era a esperança de socialistas no fim do século XIX e no início do XX, que acreditaram - na esteira de Marx - que o aumento da interdependência e da homogeneidade da classe trabalhadora iria gerar um sentimento de solidariedade de classe cada vez maior.

A comunidade trabalhadora seria, por fim, a base para a eventual transformação do capitalismo em uma nova forma de sociedade, então amparada na comunidade de todos.

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Entretanto, em vez de trabalhadores entrando numa trajetória ascendente de interdependência e homogeneização, a dinâmica do capitalismo produziu formas cada vez mais complexas de desigualdade econômica e intensificou a competição e a fragmentação no mercado de trabalho.

No lugar de uma tendência favorável à solidariedade cada vez mais ampla entre a massa não capitalista, na maioria das vezes o capitalismo produziu, com raras exceções, círculos ainda mais estreitos de solidariedade de nicho entre sujeitos com oportunidades desiguais e segmentadas no mercado.

Em especial, quando as formas de segmentação de classe intersectam identidades como raça, etnicidade e religião, o valor comunidade/solidariedade se torna mais estreito e fraturado.

A proeminência cultural do individualismo competitivo e do consumismo privativo, combinada com o enfraquecimento generalizado das formas de solidariedade da classe trabalhadora, constitui um agudo desafio ….

Enquanto talvez seja possível para alguns indivíduos encontrar formas de escapar do capitalismo por conta própria, qualquer esforço mais sério para desafiar o capitalismo exige agência coletiva e, por sua vez, solidariedade.

E esse se mostrou um dos grandes obstáculos para a transformação e/ou superação do capitalismo: forjar amplas solidariedades necessárias para as lutas.

(Texto adaptado - P. 41 e 57/58 - C S AC NO SEC XXI? - Erik Olin Wright)

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Última modificação em Sexta, 09 Fevereiro 2024 12:39
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